17 de outubro de 2012

O Fim






O livro ainda está entre minhas mãos. Releio a última frase, e olho o vazio que resta na página. Acho que é um pouco do que me resta desse instante: uma alma branca.
Viro a página como se buscasse um epílogo inexistente ou um capítulo secreto reservado apenas para os mais curiosos. Procuro em vão por uma frase mais, uma espécie de consolo para meu abandono.
Mas isso é esperar por uma ressurreição. E, para mim, é certo que o final de um livro é uma pequena morte. Jazem ali os desejos que compartilhei com suas personagens, e morre esse mergulho fantasioso que encheu meu mundo de cores diferentes das de sempre. Num empuxo violento, volto à superfície branca da realidade. Sinto meus pés tocarem o chão mais uma vez, e meus sapatos parecem duros e ásperos.
Aproximo o livro de meu rosto e inspiro profundamente, sem me dar conta da estranheza de tal cena. Não importa, é como se beijasse um amor carinhosamente pela última vez. Pouso o livro em meu colo. Sei que aquela é a nossa despedida.
Nada me preparou para este momento, nem mesmo o tato das páginas emagrecendo em minha mão direita. Perco um mundo que era nosso, do livro e meu. Ganho uma porção de memórias que, se forem boas o bastante, se tornam inesquecíveis.
Sempre achei que havia um quê de mágico nesse instante fugaz em que olhos terminam de correr a última palavra de um livro. É uma espécie saudade de algo que nunca tive.
Depois, o livro volta para a prateleira. Agora, ele torna-se um velho amigo, e um dia abrirei suas páginas amareladas para relembrar as histórias que vivemos juntos, como a nostalgia compartilhada pelos amigos de colégio. Sou capaz de perdoá-lo pela crueldade de ter chegado ao fim quando observo que, assim como o toque dos meus dedos envergou suas beiradas, eu também carrego em mim, para sempre, sedimentos de suas palavras.